ALSPs são a inovação aberta na área jurídica

Infográfico provedores alternativos de serviços jurídicos

Ficou impróprio chamá-los de “alternativos”, pois os Provedores Alternativos de Serviços Jurídicos (Alternative Legal Service Providers – ALSPs) se tornaram o “novo normal” nos Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e alguns países da Europa. O fenômeno dos ALSPs vem sendo monitorado pelo Centro de Ética e Profissão Jurídica da Universidade Georgetown e o Instituto Thomson Reuters, que produzem um relatório bienal e, seu principal autor, James W. Jones, afirma os escritórios de advocacia e os advogados internos estão cada vez mais enxergando o valor dos provedores alternativos de serviços jurídicos.

A DISRUPÇÃO

Mudanças substanciais já eram percebidas nos serviços jurídicos corporativos, seja pela transformação digital, cada vez mais abrangente, seja pela necessidade de um gerenciamento mais efetivo, de modo a garantir a geração de valor em cada etapa da cadeia de suprimentos do serviço jurídico. Isso estava acontecendo dentro das empresas, que adotaram tecnologias e processos, muitas vezes com suporte de profissionais de operação legal (Legal Operations). Mas foi a crise da COVID-19 tornou a mudança inexorável.

As empresas foram obrigadas a adotar o digital, estabelecer o trabalho remoto e a lidar com perdas significativas de recursos de todo o tipo, inclusive do capital humano e dos ativos de processos organizacionais. Neste contexto, os ALSPs despontaram como solução para o endereçamento de serviços jurídicos com entrega a baixo custo. Depois disso, o mercado nunca mais foi o mesmo.

Os ALSPs tiveram um crescimento vertiginoso e muitos profissionais capacitados embarcaram nessa tendência, inclusive os escritórios de advocacia. Conforme o já referido o relatório da Universidade Georgetown, se instaurou um mercado jurídico em evolução no qual as fronteiras entre provedores alternativos de serviços jurídicos, escritórios de advocacia, departamentos jurídicos corporativos e até mesmo empresas de tecnologia e software estão se tornando cada vez mais tênues.

Chambers & Partners, ao trazer o ranking dos ALSPs na edição 2022, afirma que eles são a vanguarda da inovação nos serviços jurídicos e relata que os escritórios de advocacia e departamentos jurídicos estão descobrindo rapidamente que os ALSPs não são inimigos, mas sim parceiros e colaboradores em potencial na entrega de resultados aos clientes, entendendo que há espaço para flexibilidade e inovação no setor jurídico.

O QUE SÃO OS ALSPs

A expressão – provedores alternativos de serviços jurídicos (Alternative Legal Service Providers – ALSPs) – indica serviços de suporte jurídicos com entregas específicas e critérios de preço diferentes dos escritórios de advocacia tradicionais e departamentos jurídicos corporativos. Algumas definições foram superadas, como as falam em provedores não advogados, porque advogados e escritórios de advocacia têm atuado como ALSPs ou as que referem baixo custo, já que, obviamente, não é o caso das Big Four. Na minha visão, de um modo geral, os ALSPs são a transformação digital chegando na área jurídica por meio da inovação aberta.

CLASSIFICAÇÃO DOS ALSPs QUANTO AO TIPO

Quanto aos tipos, os ALSPs são independentes, cativos e não tradicionais:

  • independentes – são empreendimentos totalmente autônomos, têm seus próprios clientes, relacionamentos e serviços. Foram desenvolvidos por não advogados,  por advogados que antes atuavam em escritórios ou até mesmo ser empresas criadas por escritórios;
  • cativos – são empreendimentos pertencentes e operados pelos próprios escritórios de advocacia, uma “segunda marca” para serviços jurídicos alternativos. Este tipo é o que mais tem crescido, o que pode ser interpretado como uma reação dos grandes escritórios às mudanças de mercado e
  • não-tradicionais – são empresas de contabilidade e consultoria. As Big Four entraram no mercado jurídico corporativo de uma forma muito contundente, prestando serviços para os grandes conglomerados econômicos. Além delas, há as consultorias que entregam soluções de negócios com práticas multidisciplinares. A pesquisadora da Comissão do IBA, Maria José Esteban-Ferre, acredita que esses players mais sofisticados devem continuar ganhando mercado e que pode haver uma abordagem regulatória. Concordo. Inclusive, na Fenalaw de 2022 havia um stand enorme de uma das Big Four oferecendo serviços de Legal Operation.

CLASSIFICAÇÃO DOS ALSPs QUANTO AOS SERVIÇOS PRESTADOS

Quanto aos serviços jurídicos, os ALSPs fornecem: (1) staff jurídico flexível; (2) gestão do ciclo de vida do contrato; (3) serviços de litígio (e-discovery) e (4) terceirização de processos do setor jurídico.

Staff Jurídico Flexível

São agências fornecedoras de capital humano no setor jurídico. Disponibilizam advogados para equipes de projetos, para suprir licença temporária de advogados internos, para empresas que operam em mais de um país e precisam compor times internos com advogados em vários lugares do mundo, para empresas que querem disponibilizar mentorias de profissionais experientes para seu time jurídico, gerentes jurídicos por tempo parcial, profissionais de legal operation e consultores de tecnologia.

Uberização da advocacia? Isto não seria nada simples. Jurídico é serviço de capital humano e a advocacia é uma profissão extremamente sofisticada, não é qualquer um que faz entrega de valor. Por outro lado, estruturar um serviço em parcerias não é e nunca foi um problema na área jurídica e os próprios escritórios fazem isso. Realmente, o grande desafio desses provedores alternativos de staff é conseguir fazer garantia de qualidade do serviço jurídico, o que não é nada impossível.

Há provedores de staff flexíveis que são extremamente bem-sucedidos, inclusive ranqueados pelo Chambers & Partners, como a Lawflex. No Brasil, sei que há oferta desse tipo de serviço, mas não tenho referências quanto à qualidade. No entanto, acredito que seja possível a oferta de bons serviços e inclusive conheço inúmeros advogados no mercado, com excelente qualificação, que já trabalharam em escritórios de renome e/ou tiveram posições relevantes em empresas, mas que preferem, por várias razões, não trabalhar do modo convencional.

Os advogados Javier Fernández-Samaniego e Manuel Esteban Caballero, em um artigo publicado no Think Fide, comentam que, além dos fornecedores proeminentes, muitos escritórios começaram a oferecer advogados para projetos com capital humano próprio ou vinculado (ex-funcionários ou ex-alunos).

Gestão do Ciclo de Vida do Contrato

Gestão do ciclo de vida do contrato consiste em um projeto para promover a inovação do processo jurídico quanto a produção de contratos na empresa e fazer a gestão do conhecimento departamento jurídico, desenvolvido ao longo de centenas de negociações contratuais. A equipe de projeto deve mapear todos os processos e alçadas, levantar todos os contratos, eleger os melhores modelos, definir as métricas de produtividade e implantar a tecnologia. Isto dificilmente poderá ser levado a efeito nos departamentos jurídicos, normalmente sobrecarregados. A colaboração entre o time interno e os provedores alternativos de serviços jurídicos se mostrou um excelente caminho para a efetividade dessa abordagem. Prestamos esse serviço aqui no DEJU – saiba mais.

Serviços de Contencioso. E-Discovery

A descoberta eletrônica (e-Discovery) se refere à captura adequada de dados eletrônicos armazenados nas bases de dados (electronically stored information-ESI) para fins de evidência em investigação interna, processos judiciais ou administrativos.

No mundo digital, não só o volume de dados cresceu vertiginosamente, como sua complexidade, tendo em vista as inúmeras ferramentas de comunicação corporativa e os vários sistemas integrados. A coleta adequada de dados se tornou desafiadora e demanda tecnologia robusta, com inteligência artificial, machine learning e atualizações contínuas. Essa dificuldade diminui, se o ambiente tecnológico corporativo mantiver evidências eletrônicas de forma estruturada e consistente, facilitando a identificação dos dados relevantes.

A gestão dos dados vem se tornando um assunto cada vez mais crítico. Nos Estados Unidos e outros mercados mais maduros, esta preocupação decorre da Governança de Informação e de normas a respeito do tema, a exemplo da obrigatoriedade de apresentação de provas eletrônicas de forma tempestiva ou mesmo a norma sobre dados pessoais (como a LGPD que temos aqui). Por outro lado, a redução dos volumes de dados nas empresas tem se tornado um ponto focal para contenção de custos.

A edição 2022 do Chambers & Partners relata uma ampliação de escopo dos provedores de serviços jurídicos de e-Discovery: (1) com relação aos litígios, eles mencionam plataformas de e-Discovery extremamente sofisticadas que fazem um pré-tratamento dos documentos, eliminando duplicidade e materiais irrelevantes, possibilitando que até mesmo não advogados, em outra localidade, marquem, comentem e redijam o necessário, otimizando o trabalho dos advogados que conduzem o caso e (2) com relação aos esforços de redução de volumes de dados, empresas de e-Discovery ajudam a empresa a entender quais dados estão sendo retidos, o motivo de sua retenção, por quanto tempo devem ser retidos e onde são mantidos. Este exercício permite a descoberta de dados e a identificação daqueles que podem ser eliminados.

Terceirização de Processos no Setor Jurídico

Explica o que é DEJU

LPO (Legal Process Outsourcing) é um serviço de terceirização de qualquer processo operacional da área jurídica.  Os exemplos comuns de terceirização se referem a gestão de marcas e patentes, gestão de carteiras de processos judiciais e gestão de contratos. Entretanto, soluções muito sofisticadas e complexas têm surgido no mercado.

Os já referidos advogados Javier Fernández-Samaniego e Manuel Esteban Caballero, reportam dados interessantes no Think Fide.  Contam que os LPOs americanos estão cuidando integralmente dos departamentos jurídicos de grandes corporações em centros localizados em jurisdições de baixo custo, como a Índia. Estão se transformando em verdadeiras empresas, recebendo importantes aportes de capital. Comentam que os ALSPs UnitedLex e Integration estão absorvendo departamentos jurídicos no todo ou em parte e que importantes empresas e entidades financeiras, como o Banco Santander, na Espanha, estão criando unidades de transformação em suas equipes jurídicas, com mudanças profundas no departamento.

O já referido relatório do IBA, aponta que as pequenas e médias empresas devem embarcar em estratégias de terceirização, como meio de obter melhor custo ou qualidade e que o serviço deverá contemplar a gestão do processo por valores acessíveis e forma eficiente, com reporte, comunicação e monitoramento. Realmente, a terceirização do Departamento Jurídico viabiliza um nível de serviço que seria muito difícil para uma média empresa alcançar adquirindo recursos internamente.

Ao compartilhar tecnologia, processos e pessoas entre várias empresas, a prestadora de serviços, como o DEJU, dilui seus custos tornando a solução mais acessível e efetiva.  

PROVEDORES ALTERNATIVOS NO BRASIL

Os provedores alternativos de serviços jurídicos que existem no Brasil não usam este nome. Vou citar alguns que consegui mapear, mas certamente vão faltar vários:

  • Equipe jurídica flexível. Há no Get Ninjas, Jus Brasil, Forum Hub (mais voltados para pessoas físicas), Juridoc (elaboração de documentos societários) e Freelaw (empresas). Não tenho qualquer referência sobre a performance destes ALSPs;
  • Gestão do ciclo de vida do contrato. Há inúmeros softwares muito bons softwares e serviços de implementação, no modelo descrito por Chambers & Partners. O DEJU faz gestão do ciclo de vida dos contratos em sua Plataforma Digital.
  • Serviços de litígio (e-discovery). As Big Four anunciam este serviço. Há empresas excelentes em mineração de dados em Tribunais, mas não são especificamente voltadas a buscar provas em litígio e
  • Terceirização de processos do Jurídico. A Delloite anuncia seu Legal Operate Hub, que vende serviços de terceirização de operação legal de ponta a ponta, assim como o DEJU. Quanto à terceirização do processo operacional de contencioso, considero que alguns dos bons escritórios de contencioso de volume do Brasil poderiam se caracterizar como ALSPs, porque absorvem um serviço gerenciado (propriamente dito), com reportes sobre a sua própria performance, relatório de dados relevantes, usam plataformas e outras tecnologia e conseguem praticar preços muito competitivos por conta de automação e boa gestão.

E você? Conhece algum provedor alternativo no Brasil? Deixe aqui seu comentário.

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